quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Uma linha muito tênue...

Já faz muito que tenho refletido sobre quando começa a comodidade. Sim, pois como crente na Divindade, tenho para mim a vontade de Deus, na certeza de que Ele sabe o que é melhor para mim, muito mais do que eu mesma sei. Mas às vezes me parece uma linha muito tênue a que separa a conformidade com a vontade de Deus da comodidade. A partir daí tendemos a fazer a leitura dos acontecimentos para ver onde a vida está nos levando, ou qual os planos que Ele tem para nós. Buscamos os sinais de Deus no que podem ser, em verdade, nossos desejos ou comodidades.
Quantas vezes já não escutamos "Deus quis assim", ou ainda "Essa foi a vontade de Deus". Tudo bem, há momentos em que essas frases são bastante consoladoras. Quando sobrevém a morte de uma pessoa que nos é muito querida, quando perdemos uma oportunidade que parecia ser uma "baita oportunidade", quando termina um relacionamento que "tinha tudo para dar certo"... Mas aquelas frases que escutamos são, muitas vezes, mal empregadas. Usamos para justificar nossas comodidades, para não enfrentarmos nossas dores e não cavocarmos tão fundo para descobrirmos a origem delas: a falta de amor, que, em algum momento, nos deixou uma marca.
Menosprezamos nossas dores. Buscamos respostas, o porquê do sofrimento, sem nos lembrarmos que é das dores do parto que nasce a vida. A dor faz parte do processo, do aprendizado e da própria felicidade. Nada é mais natural que o sofrimento, e por ser assim tão natural é que temos como uma capacidade nata a de transcendê-lo, superar a dor, e ainda tirar dela grandiosas lições.
É também oportunidade para praticarmos as virtudes do céu, como a paciência, a sabedoria, o equilíbrio e a esperança. Sem falar nas faltas que já cometemos, na remissão de nossos pecados diários. Pensando assim, dá até para sentir afeição pelas nossas dores, aceitá-las com maior sobriedade. Somos assim com nossas cicatrizes, por que não seríamos assim com as dores de nossa alma?
Quem não tem um amigo que já não contou uma história sobre uma cicatriz? Eu tenho uma pequena cicatriz no queixo de uma vez em que caí em uma quadra de pedras britas por correr atrás de um amigo que roubou a bola do jogo das meninas (minhas amigas adoravam quando eu contava essa história). Provavelmente ele também tenha ficado com alguma cicatriz relacionada ao mesmo acontecimento, pela qual ainda não tive a oportunidade de me desculpar. Fui uma menina muito moleca, daquelas pelas quais os meninos tinham bastante respeito (para não dizer medo mesmo!). O meu amigo? Nunca mais o vi. No fim, não pude nem continuar jogando com a bola que havia resgatado. Fui parar no hospital!
Mulheres bem resolvidas têm o mesmo sentimento com suas marcas de expressão. Orgulham-se delas como quem orgulha-se da própria empreitada.
Marcas e cicatrizes que contam pedaços de nossas histórias, que curam com o tempo e uma boa pomada cicatrizante.
E as dores que causamos ao nosso coração? E as dores que causamos no coração de um outro alguém? Quanta responsabilidade! Machucar a alma de uma pessoa, que dura uma eternidade... Claro que, sendo bastante otimista, ela terá oportunidade de, por si só, curar a dor através do perdão e da compaixão. Mas isso nem sempre acontece. 
A parte que mais me recordo da mensagem narrada por Pedro Bial, chamada "Filtro Solar" é o trecho que diz: "Não seja leviano com o coração dos outros. Não ature gente de coração leviano." (quando meus joelhos incham lembro também da recomendação: "Seja cuidadoso com os seus joelhos.")
Acho que não temos tempo suficiente para sermos mais cuidadosos com o coração das pessoas (que, até anatomicamente é mais importante que um joelho!). A gentileza acaba nos atrasando em nossos compromissos. A caridade então? Nem se fala! A paciência, sempre prolonga as consultas no escritório ou consultório. Escuta silenciosa? No horário da novela! Fala amorosa? Em retribuição aos agrados que recebemos. Já a atenção é esforço sobrenatural.
E assim, diariamente, deixamos de construir um coração mais aberto, um ser humano melhor e uma sociedade mais altruísta. Mas... Como voltei a sonhar, posso dizer que isso é possível acontecer: Dias melhores, superadas as nossas dores. Passado o inverno da alma, há de chegar a primavera. E já não passaremos pelos Ipês da Avenida Brasil, no centro de Santo Ângelo, sem percebê-los e admirá-los...
Importa é saber que assim como amar vale à pena, aceitar nossas dores, também vale! Não falo em lamentações, inconformidades, desespero ou depressão. Antes justamente o contrário. Observar nossos sentimentos e transformá-los em nosso coração. Passar todas as impurezas por um filtro chamado AMOR! Perdoar, arrepender-se, pedir perdão. E, aí sim, aceitar a vontade de Deus. Aos poucos o fardo vai ficando mais leve, se não voltarmos a carregar os mesmos pesos.
A vontade de Deus não é qualquer coisa que você aceite em sua comodidade. A vontade de Deus é a nossa felicidade, como reflexo de nossa vocação maior: o amor, em resposta a um coração aberto capaz de transmitir paz e amor à toda criação, à toda criatura, que é incapaz de machucar o coração de outra pessoa. Aliás, nada tem a ver com comodidade. É necessário muito esforço, muita renúncia à própria vontade. É preciso sacrificar muitos impulsos e reações. Tem gente que conta até 10, sem transformar os eventos dentro do coração. Outros ainda que respiram fundo para não "partir para cima" do ofensor.  Jesus deu a outra face! Tudo bem que as técnicas podem até ajudar a acalmar os ânimos, mas podem trazer grandes prejuízos ao coração se permanecer qualquer resquício de mágoa, tristeza ou raiva.
A minha maior dificuldade é exercitar o discurso com as pessoas mais próximas, com quem convivo bastante. Hoje mesmo, não passadas 3 horas do momento em que acordei, já devo um pedido de desculpas. Sorte que foi tempo suficiente para arrepender-se. Quero ser melhor! Para as pessoas que convivem comigo e para que eu mesma não precise carregar tantos pesos. Quero ser melhor com o meu coração. Nisso me ajuda a oração ou a meditação (que deveria praticar mais). A caminhar para o céu. E não falo em um céu azul de nuvens fofinhas onde pudesse me sentir bem, mas no céu do amor, onde a paz já não mais de explica, e você não apenas se sente bem, mas pratica o bem!
Tenho para mim que Deus nos quer FELIZES, mas que a felicidade não é fácil de se construir. Pode ser simples, mas nem sempre é fácil. Importa em uma consciência tranquila e um coração aberto. E para isso é preciso compreender nossas dores, aceitá-las, transformá-las. Necessário assumir nossos erros, empenhar-se em vencer nossas dificuldades e defeitos. Assumir nova postura. Amar! AMAR! A mensagem da cruz não termina na paixão, e sim na RESSURREIÇÃO!
Mas essa é apenas é a minha forma de sentir as minhas dores, meus amores e minha vida...

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